Era uma vez um catraio, (...) que cegava a mãe com tanta tropelia e diabrura. Ia a banhar-se no rio e obrigava o seu anjo da guarda a molhar as saias para tirá-lo de lá, ia a empoleirar-se no mais alto das árvores e lá tinha o anjo de bater as asas para o pousar em terra firme, ia para a linha do comboio e lá ficava o anjo com os canudos em palmito para pescá-lo da ventania da máquina, ia a meter-se na toca do lobo e tinha o anjo de acender a auréola para assustar o bicho, até que um dia disse ao catraio, vê se me dás descanso que eu tenho vinte mil anos e estou esfalfado da correria em que me fazes andar, vê se cresces, moço, que um anjo não é de pau. O moço pouco melhorou, andou o anjo naquela estafadeira anos e anos até que o moço cresceu e deu de se apaixonar por uma feiticeira que atraía os homens e os comia e deitava os restos às suas hienas gargalhosas.
Quando o moço ia a entrar na sua gruta o anjo perdeu a compostura e começou a dar-lhe carolos e a gritar, se entras aí não te posso valer, que essa mulher tem parte com o diabo e aqui à porta se acaba o meu poder. Mas ela saiu a esperá-lo, era tão linda que até o anjo estremeceu na sua alvura, levou o moço para dentro e o pobre guardião ficou à porta a arrepelar os caracóis em desespero.
Passada a noite, a feiticeira deitou fora os pedaços do moço que lhe sobraram e antes que viessem as hienas gargalhosas o anjo ali o costurou, já não era o moço de antigamente, faltava-lhe a melhor parte da carne, mas ainda mexia e disse ao anjo:
- Bendito por me protegeres e me coseres os bocados, mas em verdade te digo, se não tivesse ido lá de rojo a conhecer o diabo em forma de mulher, não te conhecia agora a bondade em forma de anjo. E seguiram o seu caminho e nunca mais se desavieram.
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1 comment:
É aquilo que sempre digo, temos de ser nós a bater com a cabeça para aprender. Não adianta que nos digam, que nos avisem, só aprendemos quando vivemos, quando sentimos na pele.
Todos temos um anjo, eu tenho a sorte de ter vários. Obrigada.
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